
Nostalgia como mercadoria: o esgotamento dos live-actions
Texto por Artur Narciso Pinheiro, estudante de Jornalismo da UFG e que escreve criticamente sobre cultura, mídia e música.
Disney lança mais um filme sem charme numa tentativa de refazer o que algum dia foi mágico.
Reprodução: Disney
O milésimo live-action de princesas da Disney foi lançado e a escolhida da vez foi Branca de Neve. A verdade é que o filme não surpreendeu ninguém, pelo menos não de forma positiva. A recepção da crítica foi morna, anotando somente 40% do termômetro do site Rotten Tomatoes, e como um espectador, confesso que saí do cinema com a sensação de ter assistido a mais uma releitura forçada e esvaziada da magia que tornou a animação clássica um dos filmes mais importantes da história. A escolha de Rachel Zegler, uma atriz que pouco lembra a personagem original e muito fraca nas expressões faciais, junto à decisão de criar os sete anões em CGI, escancara o esgotamento criativo de uma indústria que parece mais interessada em apresentar pautas progressistas com pouco aprofundamento do que em entregar boas histórias. Ao invés de encantar o público criando histórias novas, a Disney continua insistindo em refazer o que já funcionou um dia.
A crise criativa na indústria de Hollywood é evidenciada com essa aposta incessante dos estúdios em fazer remakes e spin-offs. Somente nos últimos 10 anos a Disney lançou os live-actions de Aladdin, A Bela e a Fera, O Rei Leão e A Pequena Sereia, fora o filme da Lilo e Stitch que estreia nas próximas semanas. Além disso, o estúdio responsável por Star Wars (que curiosamente também é da Disney) lançou mais de cinco produções spin-offs da franquia. A sensação que a indústria passa é de que o sentimento de nostalgia se tornou uma espécie de produto e em vez de promover representatividade com profundidade, os estúdios parecem tratar essas pautas como estratégia de marketing para gerar ibope.
Ademais, a decisão de não escalar atores anões e utilizar CGI parece errada, ainda mais quando o filme e os produtores afirmam que se trata de filme desconstruído e progressista. É inclusive um dos pontos mais questionáveis da produção, sobretudo por excluir profissionais que historicamente não são muito escalados e que, nesse caso, encontrariam nesses papéis uma oportunidade de visibilidade e vitrine. Ao invés da Disney e a produção do filme ter pensado em formas de recriar as clássicas figuras dos sete anões, ela apelou para o caminho mais fácil e os recriou em computação gráfica como se a presença de atores humanos fosse um problema a ser resolvido. E essa é a contradição do longa, como um filme em que todo o casting e produção se disseram disruptivos e modernos acaba por reforçar coisas tão excludentes?
No fim, o filme da Branca de Neve evidencia bem o impasse criativo da indústria: filmes que tentam parecer modernos na superfície, mas que, ao se aprofundar, mostram só longas rasos e sem magia. A Disney e a indústria como um todo (tendo em vista que o primeiro live-action da Dreamworks vem aí com Como treinar seu dragão), ao invés de focar em fazer produções novas, seguem presas ao passado, não para fazer homenagem, mas sim para reaproveitá-lo comercialmente. Resta a nós, meros espectadores, cobrar não apenas representatividade, mas principalmente criatividade para a criação de novas franquias e filmes. E, como a onda dos live-actions parece ter vindo para ficar, cabe também ao público exigir mais do que apenas nostalgia, é preciso cobrar narrativas com profundidade. Caso contrário, continuaremos consumindo as versões recicladas de clássicos que hoje são cada vez mais esquecíveis.
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