
Nostalgia como mercadoria: o esgotamento dos live-actions
Disney lança mais um filme sem charme numa tentativa de refazer o que algum dia foi mágico.
Reprodução: Disney
O milésimo live-action de princesas da Disney foi lançado e a escolhida da vez foi Branca de Neve. A verdade é que o filme não surpreendeu ninguém, pelo menos não de forma positiva. A recepção da crítica foi morna, anotando somente 40% do termômetro do site Rotten Tomatoes, e como um espectador, confesso que saí do cinema com a sensação de ter assistido a mais uma releitura forçada e esvaziada da magia que tornou a animação clássica um dos filmes mais importantes da história. A escolha de Rachel Zegler, uma atriz que pouco lembra a personagem original e muito fraca nas expressões faciais, junto à decisão de criar os sete anões em CGI, escancara o esgotamento criativo de uma indústria que parece mais interessada em apresentar pautas progressistas com pouco aprofundamento do que em entregar boas histórias. Ao invés de encantar o público criando histórias novas, a Disney continua insistindo em refazer o que já funcionou um dia.
A crise criativa na indústria de Hollywood é evidenciada com essa aposta incessante dos estúdios em fazer remakes e spin-offs. Somente nos últimos 10 anos a Disney lançou os live-actions de Aladdin, A Bela e a Fera, O Rei Leão e A Pequena Sereia, fora o filme da Lilo e Stitch que estreia nas próximas semanas. Além disso, o estúdio responsável por Star Wars (que curiosamente também é da Disney) lançou mais de cinco produções spin-offs da franquia. A sensação que a indústria passa é de que o sentimento de nostalgia se tornou uma espécie de produto e em vez de promover representatividade com profundidade, os estúdios parecem tratar essas pautas como estratégia de marketing para gerar ibope.
Ademais, a decisão de não escalar atores anões e utilizar CGI parece errada, ainda mais quando o filme e os produtores afirmam que se trata de filme desconstruído e progressista. É inclusive um dos pontos mais questionáveis da produção, sobretudo por excluir profissionais que historicamente não são muito escalados e que, nesse caso, encontrariam nesses papéis uma oportunidade de visibilidade e vitrine. Ao invés da Disney e a produção do filme ter pensado em formas de recriar as clássicas figuras dos sete anões, ela apelou para o caminho mais fácil e os recriou em computação gráfica como se a presença de atores humanos fosse um problema a ser resolvido. E essa é a contradição do longa, como um filme em que todo o casting e produção se disseram disruptivos e modernos acaba por reforçar coisas tão excludentes?
No fim, o filme da Branca de Neve evidencia bem o impasse criativo da indústria: filmes que tentam parecer modernos na superfície, mas que, ao se aprofundar, mostram só longas rasos e sem magia. A Disney e a indústria como um todo (tendo em vista que o primeiro live-action da Dreamworks vem aí com Como treinar seu dragão), ao invés de focar em fazer produções novas, seguem presas ao passado, não para fazer homenagem, mas sim para reaproveitá-lo comercialmente. Resta a nós, meros espectadores, cobrar não apenas representatividade, mas principalmente criatividade para a criação de novas franquias e filmes. E, como a onda dos live-actions parece ter vindo para ficar, cabe também ao público exigir mais do que apenas nostalgia, é preciso cobrar narrativas com profundidade. Caso contrário, continuaremos consumindo as versões recicladas de clássicos que hoje são cada vez mais esquecíveis.
Texto por Artur Narciso Pinheiro, estudante de Jornalismo da UFG e que escreve criticamente sobre cultura, mídia e música.
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