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Da cela ao poder: como o populismo penal abre caminho para o autoritarismo

Por: Maria Eduarda

Nas últimas semanas, a superprisão de El Salvador passou a ocupar os holofotes da imprensa internacional após o acordo com o governo Trump para deportação de imigrantes ilegais para o presídio. Para a (pouca) surpresa, os escândalos já começaram logo na primeira deportação em massa: a Suprema Corte tentou suspender o envio de imigrantes para o o Centro de Confinamiento del Terrorismo (CECOT), sem sucesso. 

Mas não foi só com a chegada de imigrantes que foram levantadas questões humanitárias sobre a penitenciária. Desde a sua criação, o presidente Nayib Bukele utilizou do medo generalizado da violência de gangues no país para suspender os direitos fundamentais dos suspeitos de envolvimento com o crime organizado. 

Segundo mapeamento de cinco ONGs internacionais, em 2022 (ano de inauguração do presídio), mais de 338 violações de direitos humanos tinham sido identificadas, a maioria delas sendo de prisões arbitrárias, muitas vezes com base na aparência da pessoa ou em seu local de residência. As imagens do presídio mostram um show de sadismo: detentos ajoelhados, seminus, com as mãos na cabeça, com os cabelos raspados. Por esse motivo o CECOT é frequentemente comparado ao antigo Carandiru, porém com uma lotação de 75 mil detentos. 

Mais recentemente, foi revelado que um dos deportados dos Estados Unidos para El Salvador foi enviado por engano, mas o governo Trump não demonstra preocupação em consertar o erro. O perfil oficial da Casa Branca no X (antigo Twitter) publicou uma resposta recheada de deboche ao New York Times dizendo que o rapaz “nunca voltará”. 

Novamente, não surpreende. “A única saída é pelo caixão” foram as palavras ditas por Bukele em 2022. Parece até uma piada de mau gosto, mas esse tipo de violação de direitos humanos é exatamente o projeto político que a direita quer para o Brasil. 

O deputado Nikolas Ferreira já afirmou: “Um sonho pro Brasil? Aplicar aqui o que está sendo feito em El Salvador”, e Eduardo Bolsonaro já parabenizou o presidente do país, dizendo que “El Salvador atualmente é um exemplo para o mundo, especialmente para a América Latina”. 

O populismo penal já ganhou muito espaço no debate público brasileiro. Até mesmo figuras políticas alinhadas à esquerda já embarcaram nesse tipo de discurso. O presidente Luís Inácio Lula da Silva, por exemplo, já afirmou que não permitirá que o Brasil se torne uma “República de ladrões de celular”, dias antes do Ministro da Justiça propor projeto que aumenta em 50% a pena por receptação de celulares furtados. 

Entretanto, não existe evidência científica de que o aumento de penas resulte na diminuição da criminalidade. Ou seja, o Estado terá que arcar com maiores custos com a população carcerária, possivelmente agravar o problema de superlotação nos presídios, para impor uma medida que sequer é comprovadamente eficaz.

 

As consequências caso esse avanço continue são certas: o único caminho possível para o populismo penal é o autoritarismo. Parece exagero, mas é importante lembrar que 40% da população carcerária no Brasil não foi condenada na justiça, onde a base ética é a presunção de inocência. O medo do crime cria espantalhos para combatê-lo, e no processo prende pessoas marginalizadas, que são as mais atingidas por essas prisões arbitrárias.